A menina Idalina de Oliveira, que estava vivendo no Orfanato Cristóvão Colombo, bairro do Ipiranga, cidade de São Paulo, desapareceu misteriosamente. Seu tutor Domingos Stamato buscou ajuda. A imprensa libertária mobilizou a opinião pública. Corajosamente, um militante anarquista resolveu investigar: vestiu-se de padre, entrou no orfanato e descobriu que o padre Faustino Campos estuprara a menina e enterrara o corpo no quintal. O heróico autor da descoberta, Edgard Leuenroth, em vez de homenageado, sofreu um processo judicial: só mais uma injustiça na vida desse valoroso lutador tão pouco conhecido hoje.
Edgard Leuenroth nasceu em Mogi-Mirim, interior de São Paulo, em 31 de dezembro de 1881. Cedo abandonou o curso primário. Tornou-se balconista e depois aprendiz de tipógrafo. Ingressou na carreira jornalística e percorreu diversas atividades profissionais dentro dessa área, especializando-se em arquivo jornalístico. Inicialmente seu nome aparece ligado à fundação e redação do jornal “O Boi” (1897-1899) que originou “A Folha do Brás” e “O Alfa” (1901) de Rio Claro. Em 1904, inicia sua participação na publicação “O Trabalhador Gráfico”. Em 1906, foi redator de “A Terra Livre”. Depois dirigiu “A Folha do Povo” e, em seguida, reiniciou a edição do jornal anticlerical “A Lanterna”. Fundou o periódico anarquista “A Plebe”, em 1917. Neste mesmo ano, em greve por aumento salarial, o jovem sapateiro Antônio Martinez foi assassinado pela polícia. O fato desencadeou uma grande greve geral em junho. Leuenroth fez parte do Comitê de Greve juntamente com outros anarquistas. Com a força da paralisação – talvez a maior do Brasil até os dias de hoje –, o governador se viu forçado a negociar com o comitê. Após a vitória da greve, Leuenroth acabou sendo preso acusado de mentor intelectual do movimento.
Foi um dos fundadores da Federação Operária de São Paulo e tomou parte em três congressos operários brasileiros, realizados em 1903, 1913 e 1920.
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A importância desse libertário era tão grande no meio sindical que, em 1921, um delegado do governo soviético o procurou propondo que ele fundasse o Partido Comunista do Brasil (PCB). Edgard rejeitou o convite afirmando que era anarquista e não comunista.
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Em 1933, junto com outros companheiros, Edgard Leuenroth fundou o Centro de Cultura Social de São Paulo, que existe até hoje. Foi ainda diretor do jornal ácrata “Ação Direta” em sua última fase (1958-1959). Escreveu o livro “Anarquismo – Roteiro de Libertação Social”, publicado em 1963.
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Durante décadas reuniu vasto material libertário: documentação, livros, revistas, jornais, folhetos, manifestos, cartas etc., que – corajosamente – conseguiu preservar das investidas policiais das épocas de repressão e ditadura. Hoje esse acervo constitui o Arquivo Edgard Leuenroth do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP (Universidade de Campinas – SP).
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Edgard Leuenroth colaborava assiduamente com o jornal “O Libertário” quando faleceu em 28 de setembro de 1968, convicto de suas idéias anarquistas.
Fontes:
Informativo “Libera” nº. 51, Rio de Janeiro, RJ, agosto/1995;
Revista “Letralivre” nº. 50, ano 14, 2009, Editora Achiamé, Rio de Janeiro, RJ.
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(Texto de Winter Bastos publicado no fanzine “O Berro” nº 13, novembro/2009, caixa postal 100050, Niterói, RJ, Brasil, CEP 24020971, e-mail oberrofanzine@gmail.com)